Publicado em Profeta, Teologia

Oséias, um profeta para o nosso tempo!

 Oséias foi um profeta do Reino do Norte, e exerceu seu ministério profético num período onde Israel enfrentou diversas dificuldades, como por exemplo, as conquistas assírias que ocorreram por volta de 732-734. Da sua vida temos poucos dados, e esses são narrados nos capítulos de 1-3, dados esses que são de fundamental importância para entendermos a sua ação profética.

Segundo a Escritura (Os 1-3), Oséias havia casado com uma mulher que ele amava, mas ela o abandonou. Mesmo diante dessa situação, o profeta continuou a amando e a recebeu novamente, depois de um tempo de provas e sofrimentos. Essa experiência que marcou profundamente a história do profeta se tornou símbolo do comportamento de Javé para com o seu povo. Israel como uma noiva, foi desposada por Javé, depois, se portou como uma mulher infiel, uma prostituta, provocando assim, o ciúme, a ira e furor de seu divino esposo, o qual não deixou de amá-la, mas castigou e a reconduziu a si, devolvendo a alegria do seu primeiro amor.

Oséias de forma prática e incisiva nos mostra a relação entre Javé e seu povo (Israel), através da alegoria do matrimônio. O centro de sua mensagem está em demonstrar o amor fiel por parte de Javé e o desprezo por parte do povo.

O sistema religioso, político e social desse período estavam totalmente corrompidos. Com isso, o profeta repreendeu os reis que foram escolhidos contra a vontade de Javé. Os sacerdotes que de modo imprudente levavam o povo ao aniquilamento.  Condenava as injustiças sociais e a violência que eram práticas frequentes nesse período. Além de combater a infidelidade religiosa, que associava o culto a Baal à Javé. O profeta protesta que o título “Senhor” deve ser dado somente a Javé e não mais a nenhum outro deus. Diante desse contexto que estava em profunda crise, Oséias anuncia que nosso Deus, é um Deus ciumento, que deseja possuir sem divisão o coração de seu povo, mais do que qualquer sacrifício, o que Deus quer é a conversão de seu povo: “É amor que eu quero e não sacrifício, conhecimento de Deus mais do que holocaustos” (6,6). Como consequência dessa infidelidade por parte do povo, Deus irá os castigar, com o objetivo de salvá-los, para que assim eles convertam e voltem novamente arrependidos ao seu Senhor.

O tempo do deserto será o tempo propício para um novo recomeço, onde o povo de Israel será “seduzido” novamente pelo seu Senhor, para que assim haja um novo casamento, uma verdadeira renovação da aliança total e eterna entre Deus e seu povo.

Essa breve análise do livro do profeta Oséias nos ajuda a atender como a sua mensagem é atual em nosso tempo hodierno. Esse mesmo Deus que faz uma aliança com seu povo, que o desposa como a esposa amada, continua a agir em nossa história. Hoje, ao olharmos para nossa realidade, percebemos quantas “traições” e “prostituições” por parte da humanidade ante a esse Deus que continua fiel a aliança. O homem moderno declara a “morte de Deus”, dá o seu grito de “independência” e faz a opção de agir de acordo com seu bel prazer. Mas mesmo assim Deus permanece fiel (emet), a fidelidade de Deus não é uma fidelidade passiva e indiferente, mas uma fidelidade ativa, comprometida, misericordiosa, que não se cansa e nem se esmorece. O amor misericordioso (hesed) de Deus é aquele que se compadece, que se entrega até o ponto de se rebaixar para salvar aqueles que se encontram desviados do caminho certo, porque na verdade o que Deus quer é a conversão verdadeira e total da pessoa humana: “Eu te desposarei pela justiça, e pelo direito, pelo amor e pela ternura, eu te desposarei na fidelidade e conhecerás o Senhor” Os 2,21.

Outra característica enfática de Oséias é o conhecimento de Deus. O nosso Deus é um Deus que se dá a conhecer, que se revela. Aqui precisamos nos atentar no que diz respeito ao conhecimento, para não cairmos no risco de pensarmos, que conhecimento se reduz somente ao aspecto cognitivo, intelectual. Quando o profeta fala sobre o conhecimento de Deus, ele vai além do cognitivo, ele apresenta o conhecimento como relação íntima e pessoal de convivência e diálogo. É assim que o homem deve “conhecer” a Deus.

Oséias denomina o povo de Israel, como um povo que se prostituiu e adulterou. A prostituição, consiste no amor degenerado, que leva Israel a assimilar a religião cananéia, cultuando outros deuses, desvalorizando o amor total de Deus. E o adultério que destroça o amor conjugal, causando a ruptura das relações de aliança com Deus. Mais exatamente, as relações iniciais e fundamentais entre Israel e seu Deus que são apresentadas como se fossem laços matrimoniais, a história religiosa de Israel é a história de um amor conjugal destruído por Israel.

Ao entendermos essa realidade, podemos pensar que esse foi somente, mais um capítulo da história do povo de Deus lá no passado. Mas não, esse é também um capítulo atual de nossa história. Analisando a nossa realidade hodierna, encontramos os diversos “cultos” que constantemente o homem presta a outros “deuses” como, por exemplo, o “deus” do dinheiro, do egoísmo, da auto-suficiência, do individualismo…, da mesma forma que Deus agiu com o seu povo lá no passado para que eles não se perdessem, Ele quer continuar agindo hoje, através da força de esplendorosa de seu amor misericordioso (hesed), para o que o homem moderno converta o seu coração e volte a Ele.

Contudo, para atingir tal objetivo, precisamos entender a pedagogia de Deus. Ele age de uma forma belíssima nessa nobre missão de resgatar e salvar o homem. O passo inicial se chama primeiro amor, a pregação de Oséias se fundamenta no princípio que, desde o início Javé e Israel se entregaram mutuamente de coração “Quando Israel era um menino, eu o amei, e do Egito chamei meu filho” (11,1). Deus libertou seu povo da escravidão do Egito, o episódio do Êxodo é como uma gestação, onde se criou os laços de filiação. O tempo do amor pleno entre ambos, a época do noivado, do primeiro amor.

O segundo passo é o da ruptura. O profeta descreve detalhadamente a separação radical das relações da aliança. Essa ruptura causou consequências gravíssimas em todos os sentidos, religioso, político, social, econômico etc., a vivência do amor hesed que garante toda ordem e subsistência à comunidade foi totalmente fragmentado e desfacelado, trazendo profundas e drásticas consequências para o povo.

Rompendo com os laços vitais da aliança com Deus, o povo se encontra numa situação de dispersão e castigo, eis ai o terceiro passo. Diversos oráculos de Oséias narram o anúncio de um grande castigo, eis o tempo da esterilidade. Se afastando da fonte da vida, não se pode gerar. As opções erradas que Israel optou, resultou no seu próprio castigo, chegando ao ponto de não mais poder se libertar e de ser destruída pela ira do Senhor.

Mesmo diante de toda essa situação drástica e de morte, o castigo tem uma finalidade: resgatar e salvar o povo. O castigo não é uma vingança por parte de Deus, mas é um meio que pode libertar o homem da sua condição de pecado e morte, nesse caso, ele tem uma perspectiva de esperança e salvação.

Por fim, o último passo, o novo destino. Segundo Oséias, essa fase consiste num retorno do povo as disposições do primeiro amor, ou seja, a última etapa das relações entre Deus e Israel. Aqui consiste o noivado, o tempo do deserto, o retorno às origens, cuja finalidade será um novo, feliz e fecundo encontro entre Deus e seu povo. A concretização de uma nova aliança feliz e fecunda.

Como é bonita e profunda a pedagogia de Deus, que age e continua agindo na história. Pedagogia essa que atinge o homem em sua totalidade, que dá a ele uma nova possibilidade de vida. É um processo, lento, exigente, desafiador, mas que restaura e salva. Diante dos diversos problemas enfrentamos no nosso dia a dia, e da realidade que nos interpela cotidianamente, podemos cair no desânimo, e até pensarmos que não há mais o que fazer, porque já está tudo comprometido, por esse sistema estrutural de pecado, de infidelidade, de prostituição. Mas, ao olharmos para a história e ministério de Oséias, uma esperança invade o nosso ser e nos impulsiona a continuar sem esmorecer. Ante a nuvem opaca do pecado que ofusca o Sol da liberdade e da graça, somos convidados a ter a mesma fé e ousadia de Oséias para profetizarmos para o homem moderno, que o Deus de Israel, o Deus de Jesus Cristo, é o Deus do amor hesed, o Deus que se dá a conhecer, que faz uma aliança com o seu povo, e que mesmo havendo a infidelidade, ele permanece fiel. Ele castiga, porque ama, porque quer que seus filhos sejam restaurados e vivificados, por isso os leva ao deserto, os “seduz” novamente, restabelecendo os vínculos de relação por meio da aliança. E assim, possibilita ao homem uma nova vida de graça e santidade.

 

Referências Bibliográficas

BÍBLIA DE JERUSALÉM. São Paulo, Paulus, 2004.

LACY, J. M. Abrego de. Os Livros Proféticos. Vl 4. São Paulo, Ave Maria, 2006.

[1]Maximiliano Costa


[1] Seminarista da Arquidiocese de Goiânia, no 3º ano de Teologia no IFTSC

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SANCTI AURELII AUGUSTINI – SANTO AGOSTINHO DE HIPONA

Aurélio Agostinho nasceu em Tagaste, na África do Norte, atualmente Suk Ahras, Argélia, em 13 de novembro de 354, filho de Patrício, homem pagão e de poucas posses, que no final da vida se converteu, e da cristã Mônica, mais tarde canonizada.

Agostinho estudou retórica em Cartago, onde aos 17 anos passou a viver com uma concubina, da qual teve um filho, Adeodato. Neste período ler Hortensius, obra de Cícero, que o despertou para a filosofia e para a leitura de do Antigo Testamento.

Decepcionado como proceder dos patriarcas e com a simplicidade do Antigo Testamento frente à obra de Cícero adere ao maniqueísmo. No entanto, depois ”de nove anos de erro” se afasta da seita por se sentir decepcionado com Fausto – um dos chefes maniqueu, homem louvado por sua sabedoria, “grande laço do demônio” (Confissões V, 3,3. apud 1Tm 3, 7) para Agostinho – que com o seu discurso nada pôde acrescentar, saciar a sede de Agostinho pela verdade. Agostinho viu nele apenas um grande orador que seduzia muitos por sua eloquência.

Após se decepcionar com a seita dos maniqueus, Agostinho viveu longo conflito interior – por toda sua vida –, voltou-se para o estudo dos filósofos neoplatônicos, especialmente as obras do neoplatônico Plotino, que o conduziu “[…] à certeza de um Deus Criador bom e poderoso, fonte de toda realidade” (AGOSTINHO, Santo, 1995, p. 16). Em 384 começou a ensinar retórica em Milão, onde conheceu santo Ambrósio, bispo da cidade.

“A vida de Santo Agostinho é fascinante porque nos permite surpreender – num espírito privilegiado e numa natureza humana densa e contraditória – os dois processos complementares que caracterizam a época do ponto de vista da religião: o processo individual, subjetivo, da conversão, de encontro do novo Deus proposto pela Igreja; e o processo de implicações mais vastas, objetivo, da formulação de um pensamento católico com a amplitude e a coerência de um sistema filosófico” (MADUREIRA, 1973, pp. 9-10). Foi ele que soube melhor unir e estruturar “[…] os valores cristãos emergentes, recebidos do Novo Testamento, e a tradição filosofia herdada da Grécia antiga, especialmente de Platão. Tudo isso faz dele não apenas um grande santo e um grande modelo, pelos caminhos pessoais que percorreu até converter-se, como sem dúvida o pensador mais ilustre dos primeiros tempos do cristianismo”. (MADUREIRA, 1973, p. 10)

O religioso, teólogo cristão e doutor da Igreja sistematizou a doutrina cristã com enfoque neoplatônico. A tese neoplatônica pode satisfazer Agostinho até nos pontos acima, bem como, quanto ao mal físico que poderia ser resolvido por meio da Providência divina. Pois, o mal já não era mais como “um malefício, mas sim uma contribuição ao bem comum e à beleza da ordem” (AGOSTINHO, Santo, 1995, p. 13). O mesmo não pode ser dito quanto ao mal moral, porquanto Plotino propunha respostas inadmissiveis e alegava que a matéria é  “essencialmente má, e a responsável pelo mal” (AGOSTINHO, Santo, 1995, p. 13).

No entanto, Agostinho se deixou guiar pela fé em Deus bom, o Bem supremo que tudo criou pro meio do Filho, o Verbo eterno, e que tudo o que foi criado é bom. “Ele procura explicar pela razão a origem do pecado e seu papel na obra de Deus. Em conclusão, chega a afirmar em síntese: a fonte do mal moral, o pecado, está no abuso da liberdade, mas esta é um bem” (AGOSTINHO, Santo, 1995, p. 14).

Batizado em 387 por santo Ambrósio, junto com o filho Adeodato. Tomado pelo ideal da ascese, decidiu fundar um mosteiro em Tagaste, onde nascera. Nessa época perdeu a mãe e, pouco depois, o filho. Ordenado padre em Hipona (391), pequeno porto do Mediterrâneo, na atual Argélia, em 395 tornou-se bispo-coadjutor de Hipona, passando a titular com a morte do bispo diocesano Valério.

Em sua vida e em sua obra, santo Agostinho testemunha acontecimentos decisivos da história universal, com o fim do Império Romano e da antiguidade clássica. Suas obras mais importantes são De Trinitate, sistematização da teologia e filosofia cristãs, divulgada de 400 a 416 em 15 volumes; De Civitate Dei, divulgada de 413 a 426, em que são discutidas as questões do bem e do mal, da vida espiritual e material, e a teologia da história; Confessiones, autobiografia, divulgada por volta de 400; De Libero Arbitrio onde discute sobre o bem e o mal, e muitos trabalhos de polêmica (contra as heresias de seu tempo), de catequese e de uso didático, além dos sermões e cartas, em que interpreta minuciosamente passagens das Escrituras.

Sua mãe, Mônica – “aquela viúva casta, piedosa e sóbria — como Vós a quereis —, já, certamente, mais alegre pela esperança, mas não menos remissa em prantos e gemidos, não se cansava de Vos fazer queixa de mim, durante as horas em que orava. ‘As suas preces chegaram à vossa presença’” (Confissões. III, 11,20) – atingiu o objetivo pelo qual lutara a vida toda e pode esperar tranquila a morte, que realmente ocorreu alguns meses depois, no outono de 387, na cidade de Óstia.

Agostinho estava desolado por ter perdido a mãe. Mas por outro lado tinha diante de si um futuro de verdadeira alegria e esperança. Voltou a Tagaste, vendeu as propriedades paternas e, congregando em torno de si os amigos mais fiéis, organizou uma espécie de comunidade monástica. Ali pretendia passar o resto da vida em recolhimento, aprofundando a vocação religiosa e fundamentando racionalmente a fé que abraçara.

No pensamento de santo Agostinho, o ponto de partida é a defesa dos dogmas (pontos de fé indiscutíveis) do cristianismo, principalmente na luta contra os pagãos, com as armas intelectuais disponíveis que provêm da filosofia helenístico-romana, em especial dos neoplatônicos como Plotino. Para pregar o novo Evangelho, é indispensável conhecer a fundo as Escrituras, que só podem ser bem interpretadas através da fé, pois apenas esta sabe ver ali a revelação de verdades divinas. Compreender para crer e crer para compreender, tal é a regra a seguir.

A salvação do homem, na teologia agostiniana, é algo completamente imerecida, que depende tão só da graça de Deus; graça que se manifesta aos homens por meio dos sacramentos da Igreja.

Fábio Cardoso da Silva[1]


[1] Seminarista da Arquidiocese de Goiânia, no 3º ano de Filosofia no IFTSC.

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Festa da Exaltação da Santa Cruz

Esta festa surgiu  no ano de 355, por ocasião da inauguração das duas grandes basílicas na cidade de Jerusalém: a do Calvário e a do Santo Sepulcro. A construção destas duas basílicas foi ordenada pelo imperador Constantino. O lenho da cruz foi descoberto por Santa Helena. Esta cruz tinha sido levada para a Pérsia e depois retornou a Jerusalém.

Para nós a cruz é um ponto de referência muito importante para a nossa fé e para a nossa esperança. Foi por meio dela que Cristo nos salvou e nos libertou; ela simboliza o preço pago pela nossa salvação. Quando somos apresentados à comunidade cristã, na cerimônia batismal, o primeiro sinal de acolhida é o sinal da cruz traçado em nossa fronte pelo padre, pais e padrinhos, sinalando-nos para sempre com Cristo. Contudo, o caminho da cruz se torna um caminho de luz, caminho de ressurreição. Quem quer seguir Jesus, precisa negar a si mesmo, pegar a sua cruz do dia a dia e segui-Lo. O discípulo de Cristo precisa segui-Lo em todas as circunstâncias, não só nos momentos alegres, mas também nos de dificuldade. Precisamos assumir a nossa cruz e seguir Jesus oferecendo nosso sofrimento, em união com a cruz d’Ele.

No tempo de Jesus, a cruz consistia numa haste vertical fixada no chão e uma trave horizontal que era carregada pelo condenado até o local do seu suplício. O condenado era preso na haste e era levantado. Jesus carregou a trave horizontal de Jerusalém até o Monte Calvário, local de Sua morte. Nós precisamos estar dispostos a carregar a nossa cruz com a certeza da vitória final, da ressurreição. A cruz era instrumento de suplício, escândalo para os judeus, loucura para os pagãos, mas se tornou, depois da morte de Cristo, motivo de glória. Deus poderia ter escolhido outros caminhos para nos salvar, mas escolheu o caminho da cruz, do sofrimento. Não parou, evidentemente, na cruz, na Paixão. A Paixão conduziu Jesus à ressurreição, à vitória final sobre a morte, o pecado, o demônio. Olhando para a cruz, que é sinal do amor maior de Deus para conosco, podemos ver como o Pai amou tanto o mundo a ponto de mandar Seu Filho não para condenar o mundo, mas para salvá-lo.

Diac. Ueslei Vaz Aredes[1]


[1] Seminarista da Diocese de Itumbiara, no 4º ano de Teologia no IFTSC.