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Café Filosófico – “O Homem: quem é ele?”

Café Filosófico 26 abril 2013

Quem é o homem? Sob que aspectos podemos compreendê-lo? Em tempos de tantas mudanças de parâmetros e valores, procuraremos entender estas e outras perguntas em torno do homem por meio de três autores significativos: dois marcaram a história da filosofia como um todo, uma é ainda desconhecida, mas também de grande peso, seja por sua tragetória, seja por sua síntese entre fenomenologia e ontologia.

Mas o que é um café filosófico? Uma conversa em ambiente amigável sobre um tema filosófico … uma conversa (não uma palestra) com linguagem acessível, mas sem que se perca o conteúdo. Mais do que porcurar chegar a um ponto em comum, nele procura-se compreender melhor as distinções e vislumbrar pontos de contato. Este é o nosso objetivo: conhecer melhor o tema do homem a partir de visões tão distintas e exercitar nossa capacidade de diálogo.

Para quem ficou curioso, vai uma breve apresentação dos nossos companheiros deste café:

Immanuel Kant, filósofo de significado ímpar, fixou os limites da subjetividade e do conhecimento válido para a ciência. Grande marco da crise da metafísica clássica, construiu, contudo, um sistema ético consistente que, no dizer de alguns, “salvou a própria metafísica”.

Friedric Nietzsche, grande filósofo da contemporaneidade, irônico e combativo, procurou radicalizar Kant contra ele próprio, levando suas conclusões do campo do conhecimento para o campo moral. Combateu tanto a metafísica e o cristianismo (o cristianismo que ele conheceu, ou ainda, a ideia que fez dele) quanto o niilismo, apostando em uma moral que valorizasse a vida.

Edith Stein: judia, filósofa, ateia, cristã, religiosa. Esta discípula de Edmund Husserl foi uma das primeiras mulheres a obter o Doutorado em Filosofia na Alemanha, professora em Speyer e em Münster, mas teve sua carreira universitária  abortada pela perseguição anti-seminta, em 1933. No mesmo ano tornou-se religiosa carmelita e, em 1942, morreu no campo de Auschwitz. Foi declarada mártir e santa por João Paulo II.

Contamos com sua presença!

PS: Participação e certificado de 3h extracurriculares gratuitos.

Localização: http://www.facebook.com/pages/Instituto-de-FIlosofia-e-Teologia-Santa-Cruz/199072460123078?fref=ts

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Notícia sobre o Minicurso

Alunos e professores assitem fala do Prof. Fabio FerreiraNos dias 16 e 17/04, iniciou-se a JORNADA FILOSÓFICA 2013 do Instituto Santa Cruz com o Minicurso “As bases filosóficas do relativismo”, ministrado pelos professores Dr. Adriano Correia (UFG), no dia 16, e Dr. Fábio Ferreira (UFG), no dia 17.

O relativismo, tema recorrente em nossa época, foi abordado pelos professores sob duas perspectivas diferentes. O professor Dr. Adriano discorreu sobre “A dificuldade de pensar uma verdade absoluta na filosofia pós-kantiana (Kant, Nietzsche, Heidegger)”, ressaltando os aspectos do pensamento desses filósofos que demonstram tal dificuldade. O professor Dr. Fábio, por sua vez, falou acerca de “As bases filosóficas do relativismo na ciência”, trabalhando com a hipótese de que não há, na ciência, bases filosóficas do relativismo, a partir de sua análise do pensamento de Immanuel Kant e Gaston Bachelard.

Foi o Minicurso uma oportunidade ímpar para que os acadêmicos do Instituto Santa Cruz abrangêssemos os horizontes do conhecimento, ao pensar sobre uma temática tão conflituosa e desafiadora como o relativismo. Sendo meta primeira da filosofia pensar a verdade, é muito oportuno refletir ainda mais sobre os obstáculos e limites que se impõem a esta empreita.

Certamente o Minicurso, assim como todos os eventos da Jornada Filosófica 2013 que ocorrerão, acrescentam muito à nossa bagagem intelectual, que será sempre mínima em relação à grandiosa e variada possibilidade do conhecimento.
Enfim, ansiosos e abertos aos demais encontros que se concretizarão nesta Jornada Filosófica 2013, os acadêmicos do Instituto Santa Cruz esperamos ter maiores condições de dialogar com o mundo moderno, tão diversificado em pontos de vista, para assim colaborarmos com a construção do conhecimento, que deve conduzir todos os homens à paz, harmonia e conservação do mundo e, logo, da humanidade inteira.

Adelso J. Guimarães
Seminarista da Diocese de São Luís de Montes Belos, no 3º ano de Filosofia

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SANCTI AURELII AUGUSTINI – SANTO AGOSTINHO DE HIPONA

Aurélio Agostinho nasceu em Tagaste, na África do Norte, atualmente Suk Ahras, Argélia, em 13 de novembro de 354, filho de Patrício, homem pagão e de poucas posses, que no final da vida se converteu, e da cristã Mônica, mais tarde canonizada.

Agostinho estudou retórica em Cartago, onde aos 17 anos passou a viver com uma concubina, da qual teve um filho, Adeodato. Neste período ler Hortensius, obra de Cícero, que o despertou para a filosofia e para a leitura de do Antigo Testamento.

Decepcionado como proceder dos patriarcas e com a simplicidade do Antigo Testamento frente à obra de Cícero adere ao maniqueísmo. No entanto, depois ”de nove anos de erro” se afasta da seita por se sentir decepcionado com Fausto – um dos chefes maniqueu, homem louvado por sua sabedoria, “grande laço do demônio” (Confissões V, 3,3. apud 1Tm 3, 7) para Agostinho – que com o seu discurso nada pôde acrescentar, saciar a sede de Agostinho pela verdade. Agostinho viu nele apenas um grande orador que seduzia muitos por sua eloquência.

Após se decepcionar com a seita dos maniqueus, Agostinho viveu longo conflito interior – por toda sua vida –, voltou-se para o estudo dos filósofos neoplatônicos, especialmente as obras do neoplatônico Plotino, que o conduziu “[…] à certeza de um Deus Criador bom e poderoso, fonte de toda realidade” (AGOSTINHO, Santo, 1995, p. 16). Em 384 começou a ensinar retórica em Milão, onde conheceu santo Ambrósio, bispo da cidade.

“A vida de Santo Agostinho é fascinante porque nos permite surpreender – num espírito privilegiado e numa natureza humana densa e contraditória – os dois processos complementares que caracterizam a época do ponto de vista da religião: o processo individual, subjetivo, da conversão, de encontro do novo Deus proposto pela Igreja; e o processo de implicações mais vastas, objetivo, da formulação de um pensamento católico com a amplitude e a coerência de um sistema filosófico” (MADUREIRA, 1973, pp. 9-10). Foi ele que soube melhor unir e estruturar “[…] os valores cristãos emergentes, recebidos do Novo Testamento, e a tradição filosofia herdada da Grécia antiga, especialmente de Platão. Tudo isso faz dele não apenas um grande santo e um grande modelo, pelos caminhos pessoais que percorreu até converter-se, como sem dúvida o pensador mais ilustre dos primeiros tempos do cristianismo”. (MADUREIRA, 1973, p. 10)

O religioso, teólogo cristão e doutor da Igreja sistematizou a doutrina cristã com enfoque neoplatônico. A tese neoplatônica pode satisfazer Agostinho até nos pontos acima, bem como, quanto ao mal físico que poderia ser resolvido por meio da Providência divina. Pois, o mal já não era mais como “um malefício, mas sim uma contribuição ao bem comum e à beleza da ordem” (AGOSTINHO, Santo, 1995, p. 13). O mesmo não pode ser dito quanto ao mal moral, porquanto Plotino propunha respostas inadmissiveis e alegava que a matéria é  “essencialmente má, e a responsável pelo mal” (AGOSTINHO, Santo, 1995, p. 13).

No entanto, Agostinho se deixou guiar pela fé em Deus bom, o Bem supremo que tudo criou pro meio do Filho, o Verbo eterno, e que tudo o que foi criado é bom. “Ele procura explicar pela razão a origem do pecado e seu papel na obra de Deus. Em conclusão, chega a afirmar em síntese: a fonte do mal moral, o pecado, está no abuso da liberdade, mas esta é um bem” (AGOSTINHO, Santo, 1995, p. 14).

Batizado em 387 por santo Ambrósio, junto com o filho Adeodato. Tomado pelo ideal da ascese, decidiu fundar um mosteiro em Tagaste, onde nascera. Nessa época perdeu a mãe e, pouco depois, o filho. Ordenado padre em Hipona (391), pequeno porto do Mediterrâneo, na atual Argélia, em 395 tornou-se bispo-coadjutor de Hipona, passando a titular com a morte do bispo diocesano Valério.

Em sua vida e em sua obra, santo Agostinho testemunha acontecimentos decisivos da história universal, com o fim do Império Romano e da antiguidade clássica. Suas obras mais importantes são De Trinitate, sistematização da teologia e filosofia cristãs, divulgada de 400 a 416 em 15 volumes; De Civitate Dei, divulgada de 413 a 426, em que são discutidas as questões do bem e do mal, da vida espiritual e material, e a teologia da história; Confessiones, autobiografia, divulgada por volta de 400; De Libero Arbitrio onde discute sobre o bem e o mal, e muitos trabalhos de polêmica (contra as heresias de seu tempo), de catequese e de uso didático, além dos sermões e cartas, em que interpreta minuciosamente passagens das Escrituras.

Sua mãe, Mônica – “aquela viúva casta, piedosa e sóbria — como Vós a quereis —, já, certamente, mais alegre pela esperança, mas não menos remissa em prantos e gemidos, não se cansava de Vos fazer queixa de mim, durante as horas em que orava. ‘As suas preces chegaram à vossa presença’” (Confissões. III, 11,20) – atingiu o objetivo pelo qual lutara a vida toda e pode esperar tranquila a morte, que realmente ocorreu alguns meses depois, no outono de 387, na cidade de Óstia.

Agostinho estava desolado por ter perdido a mãe. Mas por outro lado tinha diante de si um futuro de verdadeira alegria e esperança. Voltou a Tagaste, vendeu as propriedades paternas e, congregando em torno de si os amigos mais fiéis, organizou uma espécie de comunidade monástica. Ali pretendia passar o resto da vida em recolhimento, aprofundando a vocação religiosa e fundamentando racionalmente a fé que abraçara.

No pensamento de santo Agostinho, o ponto de partida é a defesa dos dogmas (pontos de fé indiscutíveis) do cristianismo, principalmente na luta contra os pagãos, com as armas intelectuais disponíveis que provêm da filosofia helenístico-romana, em especial dos neoplatônicos como Plotino. Para pregar o novo Evangelho, é indispensável conhecer a fundo as Escrituras, que só podem ser bem interpretadas através da fé, pois apenas esta sabe ver ali a revelação de verdades divinas. Compreender para crer e crer para compreender, tal é a regra a seguir.

A salvação do homem, na teologia agostiniana, é algo completamente imerecida, que depende tão só da graça de Deus; graça que se manifesta aos homens por meio dos sacramentos da Igreja.

Fábio Cardoso da Silva[1]


[1] Seminarista da Arquidiocese de Goiânia, no 3º ano de Filosofia no IFTSC.

Publicado em Filosofia, Lógica

OS PRINCÍPIOS LÓGICOS (II)

Continuação do texto “Os princípios lógicos (I)”.

O Princípio do Terceiro Excluído ou de Exclusão

Trata-se de mera decorrência dos dois primeiros princípios. É estabelecido da seguinte forma: “Entre o ser e o não-ser não existe meio termo”. Ou seja, dadas duas proposições com o mesmo sujeito e o mesmo predicado, uma afirmativa e outra negativa, uma delas é necessariamente verdadeira e a outra necessariamente falsa. ‘A é x ou não-x’, não havendo terceira possibilidade. Toda coisa deve ser verdadeira ou então falsa e manifesta suas características pelas quais é identificada, ou simplesmente não é e, neste caso, exclui as possibilidades contrárias.

Em lógica, inexiste meio termo entre verdade e falsidade. Dizer que algo é “mais ou menos” indica apenas intensidade que já é identidade. “O café está mais ou menos quente, ou morno” é um estado definido. Entre o preto e o branco existe o cinza, que é, igualmente, uma cor determinada. Assim, se algo é, ele o será verdadeiro – de acordo com uma realidade, ou será falso – em desacordo com uma realidade. Nunca mais ou menos verdadeiro ou mais ou menos falso. Relativamente às proposições, formula-se princípio de Exclusão dizendo que “Toda proposição ou é verdadeira ou é falsa, não havendo intermediário entre a verdade e a falsidade”.

O Princípio da Razão suficiente

Este princípio é também considerado como um dos princípios lógicos. Pode ser exposto assim: um enunciado é verdadeiro ou falso; se pretende ser ele verdadeiro, necessita uma razão que o fundamente, que o apoie. Chama-se a essa razão de “suficiente” quando, por si, é bastante para servir-lhe de completo apoio. É uma razão suficiente, quando não falta mais nada para que o enunciado seja verdadeiro.

O Princípio do silogismo

Outro princípio também considerado entre os lógicos é o Princípio do silogismo, que se pode enunciar assim: “Se a implica b e se b implica c, a implica c”. A implicação, no sentido lógico-formal, é uma relação que afirma que um enunciado resulta necessariamente de outro. Assim, por exemplo, “a lei da gravitação implica a da queda dos corpos”.

Antônio José Resende[1]

REFERÊNCIAS

COPI, Irving M. Introdução à lógica. Trad. Álvaro Cabral. 2. ed. São Paulo: Mestre Jou, 1978.
PINTO, Mário. Elementos Básicos de Lógica. 4. ed. Belo Horizonte: PUC-MG/FUMARC, 1984.
CHAUI, Marilena. Convite à Filosofia. São Paulo: Ática, 1994.
KNEALE, William e KENEALE, Martha. O Desenvolvimento da lógica. 3. ed. Trad.de M. S. Lourenço. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 1991.


[1] Professor no IFTSC e na PUC-Goiás

Publicado em Filosofia, Lógica

OS PRINCÍPIOS LÓGICOS (I)

O raciocínio como resultado do encadeamento ordenado e com nexo de proposições que se relacionam e estabelecem dependência ou oposição entre si obedece a três princípios, condições de toda verdade, consagrados pela lógica, como sendo:

O Princípio de Identidade

Um ser é sempre idêntico a si mesmo: ‘A é A’. É o princípio da determinação e sobre ele pouco se pode dizer, visto tratar-se do óbvio. É expresso, simplesmente “O que é, é”. Significa que em todas as coisas existe uma identidade entre a sua noção e seus componentes. Ela é o conjunto de seus caracteres e, parcialmente, cada um deles. Ele enuncia a impossibilidade em que se encontra a mente humana de pensar uma noção e seus caracteres constitutivos como reciprocamente dissemelhantes. Assim, por exemplo, dizer “o homem é um animal racional” ou qualquer outra afirmação estabelece uma determinação que, sob algum aspecto e alguma maneira, é, existe e que não pode não ser. Aplicado às proposições, este princípio diz que “Toda proposição é equivalente a ela mesma”.

O Princípio de Contradição

Também denominado princípio de não-contradição. É uma decorrência do primeiro e que melhor o explica. É assim expresso: “Uma coisa não pode ser e não ser (ou deixar de ser) ao mesmo tempo e sob o mesmo aspecto”. Ou seja, é impossível que um ser seja e não seja idêntico a si mesmo ao mesmo tempo e na mesma relação. É impossível ‘A é A e não-A’. Quando uma noção é admitida ou aceita, isto implica que nossa mente não pode aceitar que a mesma não exista ou não ocorra, sob pena de incorrer num absurdo. Se é não pode deixar de ser. Assim, “Não posso ser eu e não ser eu”, como “Não posso estar aqui agora e não estar aqui agora”.

Note-se que a contradição envolve simultaneidade, pois sucessivamente pode existir em outro lugar, sem me contradizer. Da mesma forma, importa considerar a identidade dos aspectos, uma vez que sob aspectos diferentes não há contradição. Por exemplo, “Sócrates não pode ser rico e pobre” (sob o aspecto monetário), mas pode, perfeitamente, ser “pobre, monetariamente, e rico de espírito”. Nada impede que uma pessoa seja “aluno” e “professor”, ao mesmo tempo, sob aspectos diferentes. Aplicado às proposições, este princípio diz que “nenhuma proposição é verdadeira e falsa ao mesmo tempo”.

Antônio José Resende[1]

REFERÊNCIAS

COPI, Irving M. Introdução à lógica. Trad. Álvaro Cabral. 2. ed. São Paulo: Mestre Jou, 1978.
PINTO, Mário. Elementos Básicos de Lógica. 4. ed. Belo Horizonte: PUC-MG/FUMARC, 1984.
CHAUI, Marilena. Convite à Filosofia. São Paulo: Ática, 1994.
KNEALE, William e KENEALE, Martha. O Desenvolvimento da lógica. 3. ed. Trad.de M. S. Lourenço. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 1991.


[1] Professor no IFTSC e na PUC-Goiás

Publicado em Autores Renomados, Educação, Filosofia

CONSIDERAÇÕES SOBRE A “ALEGORIA DA CAVERNA” DE PLATÃO

No Livro VII (Alegoria da Caverna) de A República, Platão realiza um “raciocínio por analogia” para falar da educação ou da sua falta[1]. Portanto, a “Alegoria da caverna” tematiza o estado de nossa alma com relação à educação ou a ausência desta. Ou, segundo Werner Jaeger, uma alegoria da natureza humana e da sua atitude perante a cultura e a incultura, isto é, da paideia (formação/educação) e da apaideusia (ausência de educação).[2]

Paideia significa meta suprema, isto é, a busca do conhecimento da ideia do Bem, medida de todas as medidas. A Paideia não é focada aqui do ponto de vista do absoluto, mas antes do ponto de vista do Homem: como transformação e purificação da alma, para poder contemplar o Ser supremo (princípio universal do Bem).

A educação é aqui um tema essencial. Através dela mostra-se o processo mediante o qual a visão pode realizar a ascensão da alma à região da luz e da verdadeira realidade. A reforma da Cidade pressupõe uma reforma da educação, em particular dos futuros filósofos que assumirão a direção da Cidade.

Educação=paideia=transformação da alma; obra de libertação do conhecimento, ou seja, consiste em libertar a alma da prisão e da obscuridade da opinião comum.

O objetivo de Platão é mostrar a diferença entre o mundo sensível (das sombras) e o mundo inteligível (das ideias). Através da teoria das ideias ele mostra as duas principais formas de conhecimento:

a) mundo sensível, que é a realidade das coisas empíricas, dos fenômenos, que é acessível aos sentidos. É o mundo da multiplicidade, do movimento, ilusório, pura sombra do verdadeiro mundo.

b) mundo inteligível é o mundo das ideias (eidos, em grego). É o mundo das essências imutáveis, que o homem não pode atingi-lo completamente nem explicá-lo de forma absoluta, mas o atinge pela contemplação e pela depuração dos enganos dos sentidos.

Acima de todas essas ideias gerais, está a Ideia do Bem, a mais alta em perfeição e a mais geral de todas. Os seres (ou seja, as coisas) existem na medida em que participam do Bem. O Bem supremo é também a suprema beleza. É Deus para Platão.

Roberto Machado[3] diz que, em uma primeira determinação, o platonismo consiste em distinguir essência e aparência, inteligível e sensível, original e cópia, ideia e imagem. Essa “dualidade manifesta” marcou a história da filosofia. Segundo Nietzsche, toda a filosofia a partir de Platão se desenvolve nos quadros de uma oposição entre aparência sensível e essência inteligível. Pois, para Platão, não pode haver verdadeiro conhecimento do sensível. O que corresponde ao domínio do sensível é apenas opinião – conjectura e crença – e não saber, conhecimento, ciência. Só do inteligível, das essências, das ideias, é possível haver verdadeiro conhecimento.

Passos do processo mostrado na alegoria:

a) Homens situados na caverna. Tomam as sombras por realidade: é a ilusão obstinada do “senso comum” que considera como única realidade a que se ouve, vê ou se conhece por meio dos sentidos e julga absolutamente impossível que possa existir uma outra.

b) Passagem da ausência de conhecimento verdadeiro para o conhecimento verdadeiro.

Ausência de conhecimento: visão parcial, visão limitada, ignorância, obscuridade, violência.

Condições de emitir uma “opinião correta”, “verdadeira”, (doxa).

c) Diálogo, dialética e reminiscência.

Há um conhecimento das Ideias que surge a partir de uma relação imediata da alma com as mesmas (anámnesis). Tal conhecimento, resultante de um esforço da alma, indica-nos que o “diálogo” e as “percepções” (aísthesis) suscitam o conhecimento das Ideias, não o produz. Em ambos, tal “suscitar” surge a partir da “contradição”.

d) Mundo das Ideias: o que permanece das coisas = formas reais = conhecimento verdadeiro = contemplação = ciência, (epistéme).

e) O filósofo (sábio) deve voltar à caverna.

Há uma dialética ascendente e uma descendente.

Ascendente: vai das hipóteses às formas reais; eleva-se cada vez mais alto até o princípio máximo de inteligibilidade.

Descendente: ao se aproximar do princípio não hipotético do Bem, a filosofia pode voltar e iluminar o que está abaixo, levar a clareza aos outros níveis

Enfim, o que caracteriza a démarche de Platão é a busca de um conhecimento inteligível (princípio de inteligibilidade), que é o que se pensa melhor e o que torna possível conhecer o mundo das aparências, por conseguinte, o sensível. Propõe-se uma ascenção para o Bem e retorno ao mundo das imagens.

Antônio José Resende[4]


[1]  PLATÃO. A República: Livro VII. Apresentação e comentários de Bernard Piettre. Brasília: UnB; São Paulo: Ática, 1989., 524d e 514a

[2] JAEGER, Werner W. Paidéia: a formação do homem grego. São Paulo: Martins Fontes, 1986.

[3] MACHADO, Roberto. Deleuze e a Filosofia. Rio de Janeiro: Graal, 1990, p.25.

[4] Professor no IFTSC e na PUC-Goiás

REFERÊNCIAS

PLATÃO. A República: Livro VII. Apresentação e comentários de Bernard Piettre. Brasília: UnB; São Paulo: Ática, 1989.
SARDI, Sérgio A. Diálogo e Dialética em Platão. Porto Alegre: EDIPUCRS, 1995.
JAEGER, Werner W. Paidéia: a formação do homem grego. São Paulo: Martins Fontes, 1986.
MACEDO, Leosino B. “O Mito da Caverna. Segundo a Ordem das Razões – e da Sensibilidade”. Educ. e Filos., Uberlândia, 1(2): 29-48, jan./jun. 1987.


Publicado em Autores Renomados, Filosofia, Filosofia Moderna, Metafísica

FILOSOFIA DE LEIBNIZ (II): OS FUNDAMENTOS DA MONADOLOGIA

Continuação do texto “Filosofia de Leibniz (I)

1. Leibniz elabora uma noção dinâmica do ser e rompe com a concepção mecanicista de Descartes que formula uma teoria geométrica e mecânica dos corpos. Ele explica os seres não como maquinas que se movem, mas como forças vivas.

2. Uma forma de acesso à compreensão de sua obra pode ser a partir de determinadas doutrinas lógicas por ele apresentadas, ou, por outra via, pode-se iniciar pela idéia de mônada. A Mônada é uma substância. Em Os Princípios da Filosofia ou a Monadologia, afirma o referido filósofo, que “A Mônada de que aqui falaremos não é outra coisa senão uma substância simples, que entra nos compostos; simples quer dizer sem partes. Teodicéia, § 10” (§ 1, p. 131).

Mônada é uma unidade elementar única, indivisível. Tem um certo número de propriedades, mas, por ser simples, não tem partes.

Diz Leibniz, tudo que é complexo é formado pelo simples, e as componentes simples últimas do complexo são os verdadeiros constituintes do mundo, enquanto os complexos são simplesmente produtos secundários da agregação dos simples. Com efeito, tudo o que ocupa espaço tem extensão e é, portanto, divisível e, por conseguinte, complexo.

Portanto, as componentes últimas do mundo têm de não ter extensão e, porque não a têm, não são materiais. Por conseguinte, o mundo real é constituído por uma infinidade de pontos metafísicos; e como estes itens sem extensão e indivisíveis não são materiais, têm de ser mentais.

Assim, o mundo consiste numa infinidade de itens espirituais que são como pontos ou, como muitos denominam, e às vezes o próprio Leibniz o diz, uma infinidade de almas, tudo, desde a mais importante delas, Deus, de quem tudo o resto depende, até a alma humana, que é a mônada particular que nos dá em primeiro lugar a idéia de substância, até os constituintes últimos do que, confusamente, concebemos como matéria.

3. Noção fundamental da metafísica de Leibniz: a matéria é essencialmente atividade, bem como, o universo é composto por unidades de força, as mônadas. Ele chega à noção de mônada mediante a experiência interior que cada indivíduo tem de si mesmo e que o revela como uma substancia ao mesmo tempo una e indivisível.

Tudo o que existe de complexo no mundo deve ser analisável em elementos mais simples. Se os elementos mais simples forem à mesma complexos, então têm de ser também analisáveis. Assim, acabaremos por chegar a elementos absolutamente simples que já não são analisáveis, os quais são os constituintes últimos do mundo.

Todavia, estes não podem ser materiais, porque parte da própria definição de matéria dizer que ela é algo dotado de extensão, e a extensão é, por definição, subdivisível. Obviamente, aquilo que já não é divisível não pode ser subdivisível. Assim, os constituintes últimos do mundo têm de ser não materiais e não podem ocupar espaço.

As mônadas têm consciência? Parece-nos que a resposta de Leibniz é afirmativa. Leibniz pressupunha que estes pontos últimos ou mônadas eram espíritos. Sabe-se que ele aceitava inquestionavelmente o princípio de Descartes de que tudo o que existe ou ocupa espaço ou é consciente (alma/intelecto).

No entanto, note-se que ao sustentar que as mônadas eram conscientes, Leibniz não foi ao ponto de supor que fossem universalmente autoconscientes. Pensava que as mônadas tinham percepções, tinham consciência de outras coisas para além delas próprias. Mas não afirma que as mesmas eram capazes de apercepção, isto é, a capacidade que uma consciência pode ter de estar consciente das coisas fora dela própria.

A realidade é constituída de “centros de força”, ou seja, centros de atividade, pontos ou átomos físicos e imateriais. Esses centros de força são “substâncias simples”, ou mônadas. Também denominou enteléquias para indicar a perfeição intrínseca que possuem.

Curioso notar que uma das teorias fundamentais da física do séc. XX diz que toda a matéria é redutível a energia, ou seja, que a energia é o constituinte último do universo físico. Pode-se considerar a acepção de Leibniz próximo desta idéia? Parece-nos que sim, uma vez que ele afirmava que toda a matéria era constituída por propensões para a atividade que não são em si próprias materiais.

Necessário se faz ponderar que no séc. XVII, o único vocabulário de que as pessoas dispunham para falar de centros não materiais de atividade era um rol conceitual composto de denominações como espírito, alma, mente etc., como os utilizados por Leibniz.

Neste cabedal conceitual contemporâneo do filósofo, admitia-se que a natureza consistia em matéria em movimento, e que o movimento não era intrínseco à própria matéria, mas tinha de ser comunicado ao mundo material a partir de uma fonte exterior. Leibniz não defendia esse pressuposto. Defendia que o movimento, ou a energia, ou a atividade, que é talvez o termo genérico mais adequado, é intrínseca aos constituintes últimos do mundo.

Influenciou os filósofos Frege e Russell, com a definição de que todas as proposições são verdadeiras (V) ou falsas (F). Proposições analíticas são verdades de razão; proposições sintéticas são verdades de fato. As verdades de razão são finitas e infinitas.

Existência. Propriedade da existência. 1) Só deus existe necessariamente; 2) a existência de tudo o mais depende de Deus optar por atribuir existência a essa coisa possível; 3) há infinitamente muitos indivíduos possíveis, coisas cujas noções completas são intrinsecamente coerentes.

Deus – há uma existência de sistemas possíveis – escolhe o melhor para criar. Deus contempla o inventário infindável de mundos possíveis, de sistemas possíveis de coisas que são coerentes umas com as outras e então, por ser perfeito, escolhe o melhor, isto é, o melhor dos mundos possíveis.

Tal escolha, não ocorre conforme o ponto de vista humano, prático, emocional, mas escolhe um modo mais abstrato e metafísico, ou seja, o mundo possível no qual há, grosso modo, a maior quantidade de existência.

Teoria da harmonia preestabelecida.

Razão necessária/conhecimento necessário.

Princípio da razão suficiente.

Se a nós nos parece que as coisas estão casualmente inter-relacionadas, é porque todo o cosmos é, desde o princípio e ao longo de sua história, a criação unitária de Deus, e as interconexões aparentes não são encadeamentos causais, mas uma harmonia preestabelecida que deriva desse fato.

Problema da liberdade da vontade. E o livre arbítrio existe? E o mal? Como explicar o problema do mal no mundo? Deus cria o mundo equipado. Cada indivíduo autodetermina-se perfeitamente. A pessoa age por consciência e autoconsciência, ou ao arrepio de sua verdadeira natureza?

Segundo Leibniz, Deus cria todas as outras mônadas que constituem o mundo e as equipa com uma natureza intrínseca, isto é, única em cada caso, que determina tudo o que fazem subsequentemente. Em outros termos, tudo o que acontece é preparado por Deus. A conexão causal aparente acaba por ser tão-só um qualquer tipo de correspondência ou paralelismo entre o que acontece numa coisa e o que acontece na outra.

Para a concepção de mundo de Leibniz, a força que determina cada indivíduo, uma vez desencadeada por Deus, é a natureza com que Deus equipou esse indivíduo. Neste sentido, no âmbito da liberdade, cada indivíduo autodetermina-se perfeitamente.

Philosophia perennis = plano do finalismo filosófico; pilosophi novis = âmbito especificamente científico/plano do mecanicismo científico.

Para Leibniz, extensão e movimento, figura e número são apenas determinações extrínsecas da realidade, que não vão além do plano da aparência, ou seja, do fenômeno. Prelecionam Reale & Antiseri,

A extensão (a res extensa cartesiana) não pode ser a essência dos corpos, porque por si mesma não basta para explicar todas as propriedades corpóreas. Por exemplo, como mostra Leibniz, não explica a inércia, ou seja, a relativa resistência que o corpo opõe ao movimento, a ponto de ser necessária uma “força” para desencadear tal movimento. O que significa que existe algo que está além da extensão e do movimento, que não é de natureza puramente geométrico-mecânica e, portanto, física, sendo assim de natureza metafísica, que é precisamente a “força”. É dessa força que derivam tanto o movimento como a extensão.

Cada mônada é diferente da outra (Os Princípios da Filosofia ou Monadologia, § 9). Todo ser criado está sujeito a mudança, e, por conseguinte, a mônada criada também (idem, § 10). A mudança ocorre por um princípio interno, já que uma causa externa não poderia influir em seu interior (Teodicéia, §§ 396 e 400, in Os Princípios da Filosofia ou Monadologia, § 11).

4. Caracterização das mônadas:

a) Percepção: pela percepção as mônadas representam as coisas do universo; cada um de per si espelha o universo todo;

b) A apercepção é a capacidade que a mônada espiritual tem de auto representar-se, isto é, de refletir; a mônada é consciência ou percepção consciente;

c) A apetição consiste na tendência de cada mônada de fugir da dor e desejar o prazer, passando de uma percepção para outra.

5. Há dois tipos de inconscientes: o inconsciente de percepção, próprio das simples mônadas enquanto são apenas “espelhos do universo”, e o inconsciente de imitação, pertencente apenas aos espíritos enquanto não são apenas espelhos, mas espelhos dotados de reflexão.

6. A razão dessa diferença encontra-se no fato de que as mônadas não possuem o mesmo grau de perfeição, como se segue:

a) no grau mais alto estão as “mônadas racionais”, com consciência e vontade;

b) depois as “mônadas sensitivas”, que são os animais dotados de apercepções e desejos;

c) por último, as “mônadas nuas”, corpos brutos que só têm percepções inconscientes e apetições cegas.

O melhor dos mundos possíveis e a harmonia preestabelecida

  • O universo compreendido como um todo, harmônico.
  • Relação com o modelo estoico: o universo é concebido à semelhança de um organismo pleno, cujas partes convivem numa harmonia natural e onde tudo é análogo a tudo.
  • Há uma harmonia preestabelecida, uma vez que os atos de cada mônada foram antecipadamente regulados de modo a estarem adequados aos atos de todas as outras. Isto ocorre no instante da criação. Deus a realiza desse modo.
  • Deus escolhe o melhor dos mundos dentre todos aqueles que se apresentam como possíveis.

O homem e o seu destino

  • Como explicar a presença do mal no mundo?
  • E o livre arbítrio existe ou toda ação humana já está preestabelecida?
  • O mal se manifesta de três modos: metafísico, físico e moral.
  • Metafísico: é a fonte do mal moral, e deste ocorre o mal físico. O mal metafísico é a imperfeição inerente à própria essência da criatura, pois se ela fosse perfeita, seria o próprio Deus.
  • Mal moral: surge da relação da imperfeição da criatura e sua possibilidade de contemplar o Bem. A sujeição ao erro próprio da limitação da criatura.
  • Mal físico: uma consequência física da limitação original e uma consequência ética, donde decorre a punição do pecado.

Os pontos básicos da metafísica monadológica:

  • A natureza das mônadas como “força representativa”
  • Cada mônada representa o universo e é como um microcosmos
  • O princípio da identidade dos indiscerníveis
  • As leis da continuidade e seu significado metafísico
  • A criação das mônadas e a sua indestrutibilidade

As mônadas e a constituição do universo:

  • Explicação da materialidade e corporeidade das mônadas
  • Explicação da constituição dos organismos animais
  • A diferença entre as mônadas espirituais e as outras mônadas

A harmonia preestabelecida

Deus e o melhor dos mundos possíveis (o otimismo leibniziano)

As verdades de razão, as verdades de fato e o princípio da razão suficiente

A doutrina do conhecimento: o inatismo virtual ou a nova forma de “reminiscência”

O homem e o seu destino.

Princípios constitutivos da razão humana, segundo Leibniz:

  1. Princípio do melhor (Deus cria o melhor dos mundos possíveis).
  2. Princípio de não contradição (A é A e não pode ser não-A).
  3. Princípio da razão suficiente.
  4. Princípio ou Lei da continuidade.
  5. Princípio dos indiscerníveis.

Todos estes princípios são inatos, isto é, emanam da própria razão humana e a validade dos mesmos não depende da experiência.

A experiência só fornece a ocasião para o conhecimento dos princípios inatos do intelecto.

Antônio José Resende[1]


[1] Professor no IFTSC e na PUC-Goiás

Publicado em Autores Renomados, Filosofia, Filosofia Moderna, Metafísica

FILOSOFIA DE LEIBNIZ (I)

Introdução

Gottfried Wilhelm Leibniz nasceu em Leipzig, Alemanha, em 1º de julho de 1646. Acometido de uma crise de gota, faleceu em 14 de novembro de 1716. Leibniz foi um homem de muitos interesses. Filósofo, jurista, lingüista, matemático, historiador, diplomata, suas contribuições versam desde a descoberta do cálculo infinitesimal até o esforço pelo ecumenismo e pela superação dos conflitos religiosos na Europa da época.

São suas obras principais: O discurso de metafísica (1686); Novos ensaios sobre o entendimento humano (1701-1704, publicados em 1765); Teodicéia (1710); Monadologia (1714); Princípios da natureza e da graça (1714).

Os historiadores da Filosofia costumam classificar a filosofia clássica moderna em (1) Empirismo britânico: John Locke, Berkeley e David Hume; (2) Racionalismo continental: René Descartes, Espinosa e Leibniz.

Se seguirmos essa orientação, é preciso dizer que Leibniz foi um racionalista bastante peculiar. Crítico de Descartes (em Animadversações sobre os princípios da filosofia de Descartes), de Espinosa e de Locke (em Novos ensaios sobre o entendimento humano), afasta-se do subjetivismo característico do pensamento moderno em suas origens.

Leibniz produziu um vasto sistema metafísico interligado, mas não o apresentou em uma única obra. Por isso, para compreender sua acepção ontológica do mundo e de tudo que o compõe é preciso fazer as articulações dos fundamentos da metafísica apresentados em suas principais obras. Para Leibniz, toda verdade deve ter uma razão segundo a qual ela é verdade. A tarefa da filosofia consiste na integração da totalidade do conhecimento humano.

Racionalismo e finalismo

 1. Duas relações da teoria de Leibniz com as filosofias anteriores são centrais para compreender o seu sistema filosófico:

a)           o ideal de uma explicação matemática do mundo, fornecida por Descartes, a partir da qual Leibniz pretendia lançar as bases de uma combinatória universal, espécie de calculo filosófico que lhe permitiria encontrar o verdadeiro conhecimento e desvendar a natureza das coisas;

b)           de Aristóteles e da escolástica, Leibniz assimilou a noção conforme a qual o universo está organizado de maneira teleológica, ou seja, tudo aquilo que acontece, ocorre tendendo para determinados fins.

Isto implica na possibilidade da mediação entre a philosophia perenis e os philosophi novi (Revolução científica e mecanicismo).

Dois conceitos são retomados: a) o conceito de “fim” (ou de “causa final”, juntamente com a visão teleológica geral ou finalística da realidade nele fundada; b) o conceito de “substância”, juntamente com a respectiva visão ontológica da realidade.

2. A vontade do Criador (na qual se fundamenta o finalismo) submete-se ao Seu entendimento (racionalismo). Deus não pode romper Sua própria lógica e agir sem razões, pois estas constituem Sua natureza imutável.

3. Com efeito, o mundo criado por Deus constitui-se por uma racionalidade, cumprindo objetivos propostos pela mente divina.

4. A filosofia de Leibniz que propõe superar o racionalismo cartesiano e o finalismo aristotélico apresenta como núcleo uma serie de princípios de conhecimento, dos quais se poderiam deduzir uma concepção do mundo e uma ética dotada inclusive de implicações políticas.

5. Leibniz estabelece princípios basilares de seu sistema filosófico: os princípios do melhor, de não contradição, da razão suficiente, da continuidade e dos indiscerníveis. Tais princípios são constitutivos da própria razão e, portanto, inatos. Em Novos Ensaios Sobre o Entendimento Humano, Leibniz refuta a teoria empirista de Locke (1632-1704), segundo a qual a origem das ideias encontra-se na experiência, apenas uma “tabula rasa”, uma folha de papel em branco. Para Leibniz, ao contrário, a experiência só fornece a ocasião para o conhecimento dos princípios inatos ao intelecto (Prefácio, p. 22).

6. “Daqui parece dever-se concluir que as verdades necessárias, tais quais as encontramos na matemática pura e sobretudo na aritmética e na geometria, devem ter princípios cuja demonstração independe dos exemplos, e consequentemente também do testemunho dos sentidos, embora se deva admitir que sem os sentidos jamais teria vindo à mente pensar neles” (Prefácio, p. 23).

7. O princípio de razão consiste em submeter toda e qualquer explicação ou demonstração a duas exigências:

a) A primeira funda-se no caráter não contraditório daquilo que é explicado ou demonstrado; é a razão necessária ou principio de não contradição.

b) A segunda exigência consiste em que, além de explicado ou demonstrado não ser contraditório (e sendo, portanto, possível sua existência), a coisa em questão também existe realmente; é a razão suficiente. Com efeito, uma coisa só pode existir necessariamente se, além de não ser contraditória, houver uma causa que a faça existir.

8. Além da causa eficiente que produz as coisas segundo o princípio de razão (não contradição e suficiência), intervém nessa produção a causa final. A primeira é de tipo matemático e mecânico, a segunda é dinâmica e moral.

9. O fim da produção das coisas é a vontade justa, boa e perfeita de Deus, que deseja essa produção. O finalismo é que sustenta o princípio do melhor: Deus calcula vários mundos possíveis, mas faz existir o melhor desses mundos. O critério do melhor tem conotação moral.

10. O mal é a simples sombra necessária do bem. O finalismo, desse modo, mostra o otimismo leibniziano do melhor dos mundos possíveis.

11. O princípio da continuidade afirma que a natureza não dá saltos; assim como não há vazios no espaço, assim também não existem descontinuidades na hierarquia dos seres. Por exemplo, as plantas não passam de animais imperfeitos.

12. O princípio dos indiscerníveis constitui a multiplicidade e a individualidade das coisas existentes. Leibniz afirma que não há no universo dois seres idênticos e que sua diferença não é numérica nem espacial ou temporal, mas intrínseca, isto é, cada ser é em si diferente de qualquer outro. A diferença é de essência e manifesta-se no plano visível das próprias coisas.

Antônio José Resende[1]


[1] Professor no IFTSC e na PUC-Goiás